zoom

O que é conceitual e o que é comercial na produção artística


Fábio Porchat, Márcio Garcia e Suzana Pires falam sobre o cinema brasileiro atual

A princípio, tinha dúvidas sobre qual seria meu posicionamento sobre o que é arte. Em um primeiro momento, estava inclinado a dizer que a concepção de arte consiste em qualificar todo conteúdo visual (incluindo a literatura), sonoro, material, e sensorial que tenha a capacidade de, além de difundir ideias, possuir importância reflexiva sobre assuntos de interesse geral, criando um canal de comunicação que tem um potencial de gerar um formador de opinião positivo para a vida em sociedade e que seja um registro do tempo em que o material foi produzido.

Claro que essa opinião é compartilhada por muitos críticos de arte, filósofos, e pensadores, pois para muitos o caráter aurático da arte só se mantém intacto nessas condições.

Segundo Walter Benjamin:

O que faz com que uma coisa seja autêntica é tudo o que ela contém de originariamente transmissível, desde sua duração material até seu poder de testemunho histórico. Como esse testemunho repousa sobre essa duração, no caso da reprodução, em que o primeiro elemento escapa aos homens, o segundo – o testemunho histórico da coisa – encontra-se igualmente abalado. Não em dose maior, por certo, mas o que é assim abalado é a própria autoria da coisa.

BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica. In: ADORNO et al. Teoria da Cultura de massa. Trad. de Carlos Nelson Coutinho. São Paulo: Paz e Terra, 2000. p.225

Benjamin afirma que a reprodutibilidade técnica da obra de arte atinge a aura do objeto sendo esse processo um sintoma que ultrapassa o domínio da arte. A reprodução faz uma obra, que supostamente seria eternamente única, perder seu valor original. Além de ser um material “genérico” utilizado na cópia, o objeto torna-se moldado para fins comerciais, a partir do momento que não apresenta poder de testemunho histórico satisfatório para preservar a autenticidade, não contendo material originalmente transmissível.

À medida que as obras de arte tornam-se mais acessíveis, mais é afetada a qualidade da própria natureza da arte, pois seu valor expositivo lhe empresta funções novas de maneira que a função artística apareça como acessória. Como afirma Bertolt Brecht, citado por Benjamin, “desde que a obra de arte se torna mercadoria, não mais se lhe pode aplicar a noção de obra de arte”.

De fato esses argumentos possuem valor e devem ser considerados, porém, há dois critérios que devemos considerar:

Em primeiro lugar, não é por que o conteúdo teve uma “rachadura na sua aura” que ele perde sua relevância artística. Até mesmo o produto voltado para o entretenimento, que não apresenta relevância no poder de testemunho histórico, precisa ter características de desenvolvimento criativo e lógico, bem como ser preciso em termos estéticos para que o conteúdo tenha aprovação diante da opinião pública. Claro que fazer a arte com capacidade originalmente transmissível é o objetivo de qualquer artista, porém, é errado afirmar que o conteúdo comercial não é arte. Como um exemplo, cito o filme “Homem de ferro”. Baseado na famosa história em quadrinhos da Marvel, o filme tem qualidade artística incrível se levarmos em consideração a composição do desenvolvimento 3D, do desenvolvimento gráfico, da direção de arte, da direção de fotografia, da atuação do ator Robert Downey Jr, entre outros diversos fatores.

Claro que o filme é um clássico blockbuster americano sobre super-heróis, que apresenta qualidade reflexiva mínima para a vida em sociedade, além de difundir valores morais etnocêntricos, mas não devemos ignorar a capacidade técnica, criativa e artística desse material. O filme “Homem de Ferro” é de fato, arte. A revistinha em quadrinhos não entra nem em discussão.

Em segundo lugar, não é por que o conteúdo tem propriedade comercial que ele não pode apresentar mérito aurático. Historicamente, há incontáveis obras que possuem capacidade reflexiva, que possuem essência transmissível, cujo talento de seus artistas realizadores foi reconhecido pelo mercado.

Apesar de rígido quanto sua opinião em relação a arte no século XIX, Benjamin era otimista. Para ele, o cinema era a glória da reprodução na época e isso poderia representar a transferência da forma de produção para as massas. Como foi concretizado, assim como a música, a literatura, entre todas as formas de produção de conteúdo.  Os agentes reguladores da sociedade civil ainda censuram de certa maneira a produção de conteúdo, principalmente na televisão, porém, a liberdade de expressão é uma característica que cresce nitidamente em progressão geométrica na arte comercial.

É possível fazer um produto que transmita mensagens transformadoras e geradoras de reflexão. Porém, de fato há uma rachadura na aura quando a arte se transforma em produto, mesmo que ele possua propriedade originalmente transmissível, pois esse conteúdo terá que se conformar aos limites aceitáveis pelo código moral socialmente aceito, além de ter que se adequar a algum quesito estético ou ideológico que possibilite ao mesmo ter poder de venda.

O produtor cultural precisa colocar a aura em cheque se quiser obter potencial de venda e aceitação crítica, já que uma ruptura muito grande do padrão estético ou um roteiro inconveniente aos códigos morais torna a obra obscura imediatamente (apesar de possivelmente ser reverenciada no contexto erudito).

AV1S acredita no equilíbrio entre o conceitual e o comercial. Apesar de apostar no conteúdo que tenha mérito aurático, sabemos que a chance de chegar no grande público e ganhar difusão é muito menor se não houver certa adequação ao mercado. É preciso encontrar ponto de encontro entre esses elementos. Não é por que uma coisa se tornou produto que ele perdeu seu poder de testemunho histórico, originalidade e transformação.

Veja esse compilado do programa que produzimos “CINEMA EM UM MINUTO” e confira a opinião de personalidades sobre o momento da indústria cinematográfica brasileira:

A pesquisa “Contribuição econômica do setor audiovisual brasileiro” mostra que a indústria cinematográfica injeta mais de R$ 19 bilhões por ano na economia brasileira, com um faturamento bruto anual de R$ 42,8 bilhões. O setor foi responsável pela criação de 120 mil empregos diretos e 130 mil indiretos no ano de 2014. Para cada emprego direto no setor, pelo menos mais uma vaga indireta é criada.

Suzana Pires no programa Cinema em 1 Minuto.
Suzana Pires no programa Cinema em 1 Minuto.
O programa "Cinema em 1 Minuto" é dirigido por Caio Bucker.
O programa “Cinema em 1 Minuto” é dirigido por Caio Bucker.
Márcio Garcia dá a sua opinião sobre a dedução fiscal na indústria cinematográfica brasileira.
Márcio Garcia dá a sua opinião sobre a dedução fiscal na indústria cinematográfica brasileira.

Acesse mais em:

http://www.instagram.com/vidaeumaso

http://www.facebook.com/avidaeumaso

http://www.youtube.com/avidaeumaso

#AV1S

Por Marcos Klein, de A Vida É Uma Só


Deixe seu comentário


Envie sua matéria


Anexar imagem de destaque